terça-feira, 10 de março de 2020

domingo, 15 de dezembro de 2019

Para meus filhos

PARA MEUS FILHOS
Alcy Araújo Cavalcante
(1924-1989)Escrevo para meus filhos. Para dizer que é tempo de esperança entre tantas desesperanças e que há, no coração grisalho, a certeza de que me realizei em vocês, em cada nascimento de vocês, em cada Natal de vocês.
Poderia dizer outras palavras, alinhar outras expressões. Mas acho que dizendo que me realizei em vocês, estou dizendo o melhor que vem do meu dentro, do que sou, do que amo como pai e como homem, cargueado pelas vivências cotidianas e relativas.
Desejo que vocês e todos que tomarem conhecimento desta crônica fiquem sabendo que eu os amo, porque vocês estão em mim, nas minhas horas nuas, nos meus instantes mais íntimos, nas coisas que mais me pertencem, como me pertencem as mágoas que plantei como um lavrador de angústias.
Estamos mudando e eu não vou garimpar palavras, nem costurar termos estabelecidos, nem concretar um poema. Não que vocês não mereçam. É que tenho medo de não ser transparente, não existir à luz equatorial, não exibir suficientemente esta alegria de curtir vocês em cada vereda por onde passam meus pés nus e pesados como barcos que buscam o fundo do mar, do grande mar absoluto.
Gostaria de construir nesta página o meu sonho, o destino de cada um. E vocês teriam as mais belas profissões, como as de santos, poetas, sacerdotes, pintores... mas quem sou eu, além de um pai, para construir destinos?
Todavia, eu ergo as mãos plenas de carinho e acaricio a cabeça de cada um, num gesto de bênção. Deus os abençoe, pelo muito que consegui ser como poeta e como homem sofrido. Feliz Natal para vocês...

terça-feira, 2 de dezembro de 2014

Uma casa coberta de flores

Uma casa coberta de flores
Alcinéa Cavalcante

Gosto de andar pela cidade prestando atenção na paisagem. Nessas caminhadas encontro de tudo: coisas feias, bonitas, diferentes, únicas, uma flor despetalada na calçada, um jardim, lixo amontoado na frente de alguns prédios, calçadas sujas e outras limpas,  casas de ar alegre, outras de ar triste e ainda outras que dão a impressão de que ali mora o mau humor e aquelas onde a gente tem certeza que mora a felicidade.
Na tarde de sábado, andando pelo bairro do Trem, deparei-me com esta casa coberta de flores. Fiquei encantada com tanta beleza. Poderia simplesmente ter parado do outro lado da rua, fotografado pra compartilhar com você e ir embora.
Mas não. Eu não ia perder a oportunidade de conhecer alguém que mora numa casa coberta de flores. “As pessoas que moram aí devem ser lindas, amorosas e de sentimentos belos”, pensei. E como é bom conhecer, ouvir, conversar com gente assim.
Bati palmas. Uma senhora com um largo sorriso me atendeu. Disse-lhe que achei  tão linda a casa  coberta de flores que queria a permissão para fotografar. Permissão concedida, fotografei.
Dona Floriza – é este o nome dela (e que nome combinaria mais com ela?) – convidou-me para o pátio cercado de plantas e passarinhos.  E ali, em confortáveis cadeiras brancas de vime, conversamos sobre flores, frutas, pássaros, amor, natureza e Deus. “Sou feliz e minha casa é protegida, não preciso colocar grades nas janelas e portas porque Deus está aqui para nos proteger. Deus está onde tem flores, onde tem natureza”, disse-me. “Você já prestou atenção que pessoas que cultivam plantas são mais felizes, mais gentis e nunca estão de mau humor?”, perguntou-me.
Sim, dona Floriza. É isso mesmo. Afinal, quem ama o belo tem sentimentos belos. Né não? Trocamos informações sobre espécies de roseiras, falamos de hortas caseiras. Ela me contou dos pássaros que visitam seu jardim, eu contei dos passarinhos que moram no meu quintal.
Não demorou muito já nos sentíamos como velhas amigas que se visitam nas tardes de sábado. Floriza me levou para ver as rosas que cultiva no quintal.
Depois, como velhas amigas, sentamos na cozinha (sempre ouvi dizer que só se leva para a cozinha da casa as pessoas mais íntimas) e comemos bolo e tomamos suco. O bolo, delicioso por sinal, ali em cima da mesa me deu a impressão de que tinha sido feito para aguardar uma visita, o suco de soja geladinho servido num copo de vidro tão límpido, delicado e com a borda dourada, foi um dos mais gostosos  que já tomei nos últimos tempos.
E ali, na cozinha, comendo bolo e tomando suco, como velhas amigas de infância, conversamos sobre a vida, filhos, trabalho e tantas outras coisas que só grandes amigas conversam.
Saí de lá bem mais feliz de que quando cheguei e com a certeza de que voltarei outras vezes. Até já combinamos um churrasco num sítio que Floriza tem na zona norte com um imenso pomar. “Nós somos desocupadas (aposentadas),  podemos qualquer hora estar juntas pra conversar”, diz ela. E depois corrige: “Quer dizer, desocupadas não. Não trabalhamos mais, mas nos ocupamos em fazer o bem, cuidar de plantas,  levar alegria para as pessoas e é isso que Deus quer”.
É verdade. Há ocupação mais prazeirosa do que essa?
Ao nos desperdirmos, ela renova o convite: “Volta sempre pra gente conversar, falar de coisas boas, tomar um café fresquinho…“.
Com toda a convicção eu respondo: “Claro que voltarei, pois amei te conhecer”.
Já na rua, olhei mais uma vez encantada para aquela casa coberta de flores, pedi a Deus que abençoe e proteja sempre Floriza e sua família e agradeci a Ele o privilégio de ganhar naquela tarde de sábado uma “nova velha amiga de infância”.

(Crônica publicada no meu livro "Paisagem Antiga", Ed. Scortecci - 2012-SP)

quarta-feira, 24 de setembro de 2014

É primavera


quarta-feira, 24 de outubro de 2012

Eu aqui

Que ingratidão a minha abandonar por tempo esse blog!
Durante todo esse tempo me dediquei mais ao www.alcinea.com mas hoje senti saudades e voltei.
E voltarei uma vez por semana para atualizá-lo.