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Índios "savanizaram" Amapá, diz estudo
Eduardo Geraque
Alguma coisa ocorreu no Amapá há 4.700 anos que alterou bastante a vegetação nos arredores do lago Márcio, perto de Macapá. Para variar, conforme sugere um estudo da UFF (Universidade Federal Fluminense), essa mudança está relacionada com a chegada do seres humanos à região.
A pesquisa, feita a partir de fósseis de pólen e amostras de carvão coletadas na região, mostra que a floresta que existia naquela área começou a desaparecer de forma acelerada a partir de 5.300 anos atrás.
Após mais de 500 anos, uma formação savânica -a mesma que existe até os dias de hoje- surgiu em definitivo no local.
"Não é possível dizer que a ocupação humana tenha causado a mudança, mas com certeza, a grande quantidade de queimadas que ocorreram na área - identificadas pela alta presença de carvão nas amostras- impediu que a floresta, após alguns séculos, voltasse a ocupar aquele terreno", diz Mauro Toledo, autor do estudo.
Os resultados obtidos pelo cientista no Amapá, no lago Márcio e em outro lago próximo, estão descritos em artigo na última edição da revista "Anais da Academia Brasileira de Ciências", disponível no site da biblioteca eletrônica gratuita Scielo (www.scielo.br).
A conhecida cronologia da ocupação da Amazônia, segundo Toledo, coincide com os dados apresentados agora.
Procura-se
O que ainda não sabe, no entanto, é a real causa da mudança brusca na vegetação local. Se os antigos índios amazônicos não desencadearam o processo que deu origem às savanas amapaenses, mas apenas ajudaram na transformação da vegetação, ainda está faltando uma peça no quebra-cabeça.
"O processo ocorreu de forma muito brusca. Não existem muitos registros sobre isso na região", diz Toledo. Mas o pesquisador tende a apontar o homem com o maior suspeito.
"Os registros de microcarvão mostram concentrações até cinco vezes maiores do que o esperado", diz Toledo. Segundo ele, essa quantidade de carvão nos sedimentos analisados é marca registrada das queimadas de origem humana.
Ao mesmo tempo em que a floresta cedia lugar ao cerrado, os lagos secavam no local. Ainda não se sabe se a seca está relacionada com a mudança na vegetação local. Mas o mistério do sumiço dos lagos é um pouco mais fácil de explicar. E, pelo menos aqui, os seres humanos aparentemente são inocentes.
Os cientistas sabem que a seca aconteceu ao analisarem uma coluna de sedimentos do local. Num período de 500 anos, não há sedimentos característicos desse ambiente -eles só reaparecem depois.
Na época em que ocorreu a seca nos lagos, o mar estava bastante alto no litoral do país. E ainda, segundo Toledo, não existe nenhum registro de mudanças climáticas significativas na região. Ou seja, a floresta amazônica, como sempre, estava úmida, com a sua tradicional alta incidência de chuvas, como ainda é registrado nos dias atuais pelos cientistas.
O aparente conjunto de dados desconexos, é rapidamente organizado por Toledo. "Como o mar estava muito alto, em seu pico, o processo de sedimentação dos rios da região deve ter sido alterado". De alguma forma, explica o cientista, o fluxo de água que alimentava os lagos, a partir do rio Amazonas (que é bastante próximo) ficou interrompido pelo monte de sedimentos novos.
"Isso, teria secado o lago por 500 anos. É como se o rio tivesse entupido". Depois desse período, com a chegada dos índios - provavelmente facilitada pelas novas savanas- nada mais seria como antes.
O estudo da UFF detectou, no passado, um efeito que os cientistas temem para o futuro da Amazônia. Modelos de clima e vegetação feitos pelo Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais) sugerem que o desmatamento, somado à mudança climática, possa transformar até 60% da floresta em cerrado. Caso essa conversão ocorra, o chamado "equilíbrio" da vegetação muda, e a floresta não mais consegue retornar.
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