Carnaval (?)
Um carnaval sem alegorias e fantasias?
Alcione Cavalcante
A “inovação” proposta para o carnaval 2008, por representantes de algumas escolas na LIESA, se levada mesmo a sério, deverá comprometer de forma inexorável, a trajetória ascendente que o carnaval do Amapá vem experimentando nos últimos dez anos, apesar de alguns percalços recentes.
A dita “inovação”, precisa ser avaliada por pelo menos duas vertentes. A primeira da oportunidade, do contexto, do momento histórico que se vive. A segunda da consistência dos argumentos que a sustentam.
Do lado da oportunidade, os operadores mais argutos e antenados do carnaval (Grande Monteiro, ex e futuro Piratão, atual Império do Povo), já nos avisavam há algum tempo que os 250 anos de Macapá, caprichosamente seriam completados justamente na quadra carnavalesca. Por outro lado, para o bem ou para o mal o Amapá estará na Sapucaí, na sola dos pés, nas fantasias e alegorias da Beija-Flor de Nilópolis e isso seguramente reservará olhares mais curiosos sobre o Estado como um todo e no particular sobre o seu povo e suas manifestações culturais, entre estas o carnaval.
Quanto aos argumentos que amparam a esdrúxula proposta, convêm citá-los pela ordem: atraso no repasses dos recursos por parte do poder público, limitações de tempo para confecção das fantasias e alegorias e o elevado preço cobrado pelo aluguel de barracões em função da impossibilidade de uso de quadras esportivas das escolas públicas.
Argumentos frágeis. Sem me propor a defender o Governo e a Prefeitura, historicamente o recurso para apoio do carnaval tem sido disponibilizado com regularidade atual, ou seja, algo próximo de dois meses antes do desfile. Registros há de repasses efetivados a tempo mais exíguo. Não é, pois, nenhuma novidade e nunca foi empecilho para que as escolas se apresentassem dignamente. A justificativa da falta de tempo também não se sustenta quando em confronto com a realidade. O início da confecção de alegorias e fantasias sempre se deu, mais ou menos, em torno de sessenta dias antes do desfile oficial. Forma encontrada pelos dirigentes para reduzir custos, principalmente no gerenciamento e manutenção dos diversos espaços destinados à elaboração/confecção das alegorias e fantasias. Aponte-se ainda que a suscitada falta de tempo atenta contra a capacidade, o compromisso e criatividade de nossos artesãos, figurinistas, donos de atelier, costureiras, sapateiros, ferreiros, marceneiros, entre outros, que se provam capazes de tirar leite de pedra. Pergunte-se e qualquer um deles assume esse desafio e cumpre sua parte.
Quanto ao aumento do preço de aluguel, este sequer merece maiores considerações. Achar que aluguel de alguns galpões pode afetar de tal ponto o mercado imobiliário local, a ponto de mais que dobrar o preço da locação na capital, é pura falácia. Não bate com o mundo real.
As reflexões que se impõem são: o aniversário de 250 anos da Cidade de Macapá e a presença do Amapá nos palcos da Sapucaí no Rio de Janeiro merecem ter por aqui um carnaval amputado em sua essência como proposto? Como irão reagir os verdadeiros amantes da festa e a comunidade aí incluídos os brincantes, torcedores e simpatizantes das escolas e da festa em si? Com explicar e decifrar o inexplicável, o esquisito, o exótico, o extravagante, com que em essência a proposta até o momento vencedora na LIESA embute e impõe?
Finalmente temos. Podemos fazer carnaval sem alegoria (s.f. exposição de um pensamento sob a forma figurada) e sem fantasia (s.f. imaginação; obra de imaginação; concepção; capricho)?
De minha parte entendo que não. Penso que isso parece coisa de quem projeta para o futuro o resultado de um jogo, que assume perdido de véspera.
Alcione Cavalcante
PS – Alcione (s.f. Estrela da constelação das Plêiades)
Alciônico (adj. Relativo a Alcione; fig.sereno, agradável; brando; suave)
Como vêem não adianta se aborrecer comigo. Vamos à passarela.
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