domingo, 12 de julho de 2009

Artigo dominical

O mínimo indispensável
Dom Pedro José Conti, Bispo de Macapá

Na vida de Santo Antão, um dos padres do deserto, se lê esta história.
Um jovem desiludido da vida decidiu ser monge. Vendeu todos os bens reservando para si somente o indispensável. Em seguida, apresentou-se a Santo Antão. Este o acolheu com bondade e perguntou-lhe se realmente tinha renunciado a toda riqueza.
– Sim – respondeu o jovem – Vendi tudo o que possuía, guardei somente o mínimo indispensável.
O Santo deu-lhe a seguinte ordem: - Se quiser ser monge de verdade, vá à aldeia mais próxima, compre um bom pedaço de carne, vista essa carne como se fosse uma roupa e depois volte para mim.
O jovem ficou intrigado com a recomendação, mas, confiando na sabedoria de Antão, obedeceu. Comprou a carne, cortou-a em fatias muito finas e colocou-as no seu corpo. Assim enfeitado, com aquela roupa tão esquisita, tomou o caminho do retorno. Foi uma volta bem amarga. Logo que saiu da aldeia, vários cachorros famintos foram atrás dele, abocanhando as carnes. Incontáveis insetos vorazes zumbiam e ferravam o seu corpo. Os urubus das redondezas também começaram a disputar o presente inesperado. O jovem chegou todo ensangüentado aos pés de Santo Antão que lhe falou:
- Viu? Aqueles que deixam tudo, mas, ao mesmo tempo, querem reservar-se o mínimo indispensável, acabam como você. Aquele mínimo de riqueza logo se tornará para eles um sofrimento insuportável.
Sempre achamos essas histórias antigas muito radicais. Pensamos serem outros tempos. É verdade, aqueles homens se foram. Contudo no evangelho de domingo, 12, Jesus envia os doze para irem às casas das redondezas sem levar praticamente nada.
A razão dessa pobreza material se chama liberdade. Não é, porém, a leveza de quem não carrega nada porque não quer se fadigar, ou porque sabe que encontrará tudo lá onde chegar. É a simplicidade de quem acredita no único tesouro que leva consigo no coração: a boa notícia do Reino, por causa do qual eles devem convidar as pessoas à conversão. Se carregassem muitas coisas, a viagem ficaria mais difícil; e a luminosidade do anúncio poderia ser ofuscada pelas aparências dos enfeites. De certa forma, nem as pessoas dos apóstolos devem aparecer, porque não estão dando testemunho próprio ou das suas idéias. No centro de tudo está a boa notícia que o Reino de Deus chegou! Nada, nada mesmo, deve atrapalhar.
Mais uma lição para nós que, às vezes, achamos que o nome do pregador famoso, seja mais importante do que a mensagem. Ou pensamos que a organização chamativa do tal grupo desperte mais atenção do que o próprio Senhor. Pobreza, então. Ordem de Jesus.
A liberdade é coisa séria. Não vale somente para os discípulos, vale também para os que podem ou não acolhê-los. Com efeito, os apóstolos não devem ficar nas casas para convencer de todo e qualquer jeito as pessoas, custe o que custar. Os que abrem as suas casas devem sentir-se livres de aceitar ou de rejeitar o anúncio do Reino. Imposições, ameaças, truques, presentes e promessas, não combinam com a alegre acolhida da Palavra do Senhor. Somente um coração livre é capaz de abrir-se à novidade da paz e do amor que os grupinhos dos apóstolos, de dois em dois, vão testemunhando. À liberdade e à simplicidade dos mensageiros deve corresponder à livre escolha de quem acolhe, para que não seja algo de superficial e de emocional, mas revele a transformação sincera da própria vida. Nenhum poder então, nenhuma imposição. Somente a liberdade do coração para que também a gratuidade do amor de Deus possa manifestar-se num encontro libertador com a pessoa amada.
Para quem recusar sobrará a poeira dos pés. Quem sabe, também a lembrança de uma ocasião livremente perdida.